terça-feira, 3 de abril de 2012

Bons ventos que sopram para o desenvolvimento

Do jardim da sua casa, localizada no Sítio Riacho Seco, em Gravatá, Agreste de Pernambuco, a comerciante Marta Maria da Silva contempla um gigante de 100 metros de altura, plantado no morro do terreno do outro lado da rua. A torre eólica produz energia limpa do vento para a região. Vento que refresca os dias de calor, seca rapidamente as roupas no varal e faz girar as pás das nove torres que integram o Parque Eólico no município. "O barulho é pouco e se confunde com o próprio barulho do vento. À noite, quando o mundo se cala lá fora, a gente escuta alguma coisa, mas eu já me acostumei e hoje acho até que sentiria falta se a torre saísse daí", diz.

Ela lembra quando, há menos de dois anos, as torres chegaram na comunidade, abrindo estradas para serem transportadas por partes em grandes caminhões, chamando a atenção de todos os moradores, como a vizinha Maria Santos, dona de um bar: "Acho bonito, mas não sei como um bichão desse faz energia do vento. Ninguém nunca veio explicar pra gente". Marta lamenta por não sentir no bolso a economia na conta de luz apesar de morar tão perto da turbina. "Eu e minha família cultivamos e vendemos mudas de flores. São quase R$ 400 por mês de energia elétrica. Queria era ter uma torre dessa no meu quintal, pagar nada pela luz e ainda ganhar dinheiro com isso", brinca, sem saber que nos países considerados os maiores produtores mundiais de eletricidade eólica, como a Alemanha, pequenos agricultores já colhem os frutos desse investimento em suas propriedades.

O Brasil, principalmente o Nordeste, possui zonas costeiras, campos abertos, morros e montanhas que, juntos, formam uma das melhores jazidas de ventos do planeta, mas precisa investir ainda mais no setor, hoje responsável por pouco mais de 1% da matriz energética brasileira. O cenário, no entanto, é promissor. Em 2011, segundo estatísticas do Conselho Global de Energia Eólica, o País atingiu o potencial instalado de 1.5 gigawatt-hora (GWh) e superou o crescimento mundial, de 21%, registrando aumento de 62%. A meta do Plano Decenal de Expansão de Energia é de que, até 2020, o Brasil passe a gerar 171 GWh, elevando a participação da energia eólica na matriz para 7%, enquanto a oferta de energia hidráulica diminua de 76% para 67%. Alguns especialistas consideram a previsão modesta e estimam que o setor pode alcançar 15% de participação até lá, ficando entre os dez maiores produtores do mundo. "Hoje é a energia mais barata do País. Já está competindo com a hidráulica e todas as outras fontes. No último leilão, em 2011, isso já ocorreu. Foi mais barata que gás natural, que todas as fontes de petróleo e que biomassa, inclusive competindo no mesmo patamar com grandes projetos de hidrelétricas, já na faixa de R$ 100 o MWh.", destaca o professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Everaldo Feitosa, que é proprietário da Eólica Tecnologia e vice-presidente da Associação Mundial de Energia Eólica.

Na onda do crescimento, vários empreendimentos de energia eólica estão se instalando no Porto de Suape, em Pernambuco. Fábricas de torres, aerogeradores, flanges e pás, de multinacionais como a Gestamp/ RM Eólica e Impsa, além das brasileiras Iraeta e Eólice, respectivamente, deixam o Estado em situação vantajosa na atração de mais investimentos para o cluster da produção de equipamentos. "É a área onde Pernambuco está atuando mais fortemente. Nós temos a melhor localização geográfica em termos de distribuição espacial destes equipamentos no Nordeste, o melhor porto para operar a importação e exportação de produtos acabados e matérias-primas, além de uma gama de incentivos fiscais robusta e um ambiente acadêmico muito favorável", ressalta o secretário executivo de Desenvolvimento de Negócios, da Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SDE) de Pernambuco, Roberto Abreu.


Com o discurso na ponta da língua e um estudo detalhado do potencial industrial do Estado no setor feito pela IBM Global Business Services - fruto de um acordo de cooperação com a Agência de Promoções de Investimentos e Exportações (Apex) e com o Banco Mundial - embaixo do braço, uma comitiva pernambucana vai marcar presença na Feira EWEA 2012 (European Wind Energy Association), em Copenhague, Dinamarca, do dia 16 a 19 de abril. "O estudo comparou Pernambuco a outros estados da Federação, a duas locações alternativas em países emergentes e a duas locações que são consideradas benchmarking mundial e mostra que Pernambuco possui uma qualidade superior para esse setor industrial no Brasil por um custo menor", explica Saul Mendonça, gerente de Segmentos Econômicos da SDE. A comitiva é formada por quatro representantes do Governo do Estado, dois da Apex e dois do Banco Mundial e, de Copenhague, vai seguir para a Feira de Hanover, na Alemanha, entre os dias 23 e 25, e, se ainda houver necessidade de captação de investimentos, participará de uma feira de igual porte nos Estados Unidos em junho.

IMPACTOS – O biólogo e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Enrico Bernard faz um alerta sobre a necessidade de investir em pesquisas para avaliar melhor o impacto dos parques eólicos na fauna local. “A energia eólica é importante e necessária para a diversificação da matriz energética do País, mas, como toda forma de energia, provoca interferências na fauna, com registros de mortes de aves, morcegos e insetos em vários lugares do mundo. Ainda não sabemos se essas mortes estão ocorrendo no País e, por isso, precisamos aferir e quantificar essa interação para saber se os impactos são negativos ou, de repente, até neutros. Mas precisamos investigar”. 


O pesquisador pretendia abordar a colisão de morcegos com as turbinas e conta que procurou as duas empresas que operam os parques eólicos existentes no Estado, mas teve o acesso negado aos locais de estudo, o que resultou na devolução de cerca de R$ 20 mil recebidos por meio de seleção nacional de projetos da Fundação O Boticário de Proteção à Natureza. “Em 16 anos de pesquisas, nunca me ocorreu nada parecido. É muito frustrante”, desabafa. O proprietário da Eólica Tecnologia, Everaldo Feitosa, empresa responsável pelas torres eólicas de Gravatá, afirma que realiza sempre estudos sobre os impactos nos parques que opera e que nunca houve registro de morte de animais. Ele questiona a forma como a pesquisa do biólogo foi apresentada. “Não fomos consultados previamente e não aceitamos que pesquisas financiadas por empresas privadas estudem nossa empresa, que também é privada. É uma proposta inconcebível”, rebate. A reportagem solicitou os resultados das pesquisas realizadas pela Eólica Tecnologia, mas não teve acesso por se tratarem de “estudos internos”.



Fonte: Por Julliana de Melo
Do NE10

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Olá! Seja bem vindo. Agradecemos a sua participação através de elogios, sugestões ou reclamações, queremos saber da sua opinião sobre o nosso blog! Um grande abraço.