quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Helder Santos: 'O regionalismo se tornou um tabu'


ENTREVISTA

Autor comenta como nasceu Raiar e de onde surgiu a vontade de reinventar o sertão moderno

“Nada acontece aqui além do povo morrer e nascer mais menino. Só tem funeral e batizado”, diz Florêncio, uma das vozes criadas pelo pernambucano Helder Santos no livro Raiar. Na entrevista abaixo, ele comenta sobre o seu sertão recriado a partir da sua experiência e, principalmente, pelas histórias contadas pelo avô. Além disso, fala sobre o desinteresse da ficção atual pelo sertão e pelo regionalismo.

AVÔ
Parte do livro nasce das histórias que eu ouvia do meu avô por parte de mãe. Ele era índio de uma tribo de Tacaratu. Viveu 109 anos e conheceu figuras como Lampião e Padre Cícero. Era um contador de histórias muito profundo. Era como Manoelzão, que foi ouvido por Guimarães Rosa. Ele ainda tinha essa tradição. Quando eu fui tentar resgatar isso, ele já estava ficando senil, perdendo noção com a realidade. Comecei assim, resgatando, mas não conseguia reconstruir as histórias completas. Então, fui recriar em cima, pequei elementos do que ele contava, do jeito de contar usando o arrodeio, de fazer inserções geográficas no texto através dos personagens.

SERTÃO ATUAL
Com minha visão, trouxe a modernidade para esse panorama. Acho que o Sertão está abandonado de certa forma, relegado. A questão do regionalismo virou um certo tabu. Como ela dominou por certo tempo, há uma rejeição hoje. Os escritores atuais preferem dizer que leem autores alemães, anglo-saxões. Mas o Sertão é uma parte do Brasil, é um dos pilares da nossa cultura. Claro, já foi usado por Guimarães Rosa, João Cabral, Graciliano, Euclides da Cunha, mas a gente precisa voltar a ele, dentro das questões das nossas últimas gerações, de misturar com a música pop e entender que nada é isolado: todo ambiente é receptivo.

TEMAS
Um dos assuntos que quis trazer é o tráfico de maconha no Sertão dos anos 1990. O livro tem um tempo que é um pouco dúbio, pode ser passado em momentos diferentes. A briga das famílias é um pouco diferente também – antes, só se falava do Sertão a partir do olhar como “coitadinho”. Afonsinho Montano, por exemplo, não é um coronel regional, é um coronel nacional. Temos esse tipo de coronéis hoje, que exportam uvas, tomates e são parte de uma dominação de 300 anos. Essa presença de Afonsinho em Angola é a continuidade do processo de dominação, de colonização.

Fonte: Do JC Online

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